sexta-feira, 21 de junho de 2013

A sina dos olhos de Marina

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Não foi pouco o que vi. Nem muito menos em demasia. Um olhar de Marina Abramovic é brisa. Na medida certa, e que traz para cada um que a vê alguma descoberta. Olhar contra o que há na vida de louco. Nada há naquele instante de oco. Olhar que é plenitude: quiça oportunidade de perfume. Que vem de toda uma trajetória devota à performance - portanto traz num simples lampejo inteira memória. E houve do amor profundo, e não mero romance com Ulay, muitos trabalhos em comum. Um mundo absoluto em comum. E somente tal casal faria um gesto tão belo: um vindo do oeste e o outro do leste da Muralha da China forjaram um encontro e despedida inconteste. O deserto de Ulay só poderia ter como desfecho os olhos de Marina. E o que há de tortuoso na muralha, para Marina, só poderia de algum modo ter como porto os olhos de Ulay. Muito vento e frio houve entre ambos: mas, sem dúvida, não pouco acalanto. E se, numa certa performance, diante de uma mesa longa, a situação era tensa de acordo com a própria proposta, o derradeiro trabalho na muralha foi uma sublime resposta.


Jamais será ínfimo um olhar de Marina. Como disse Cypriano, no olhar e no jeito de se doar de Abramovic há incontornável carisma. Sem nenhum sofisma. Carisma que se sente em sua totalidade: para o adulto, para a criança, ou seja, em qualquer idade. Marina é vida, no que possui de mais singela. E por isso tão humana. Dela emana uma aura para o qual poucas almas são eleitas. Quem não derrama lágrimas, mesmo assim, de alguma maneira derrama. Somente sabe do amor quem como esta mulher ama. Bem se percebe isto na performance "The Artist is Present", que culmina aqui no que talvez possa se considerar a mais pungente de suas obras. São dias e dias - e num único olhar quanta melodia... São horas e horas - que somam outrora e agora de forma duradoura, por mais efêmeras que sejam as horas. São minutos e minutos - porém, quantos mundos em apenas um minuto? Marina é isto: me leva do pranto ao sorriso - e nem sei bem ao certo como me dar por isso. Marina é, aviso, um momento de brisa indivisa. Marina é alento, para o coração, para o pensamento. Marina é um recado, com seu olhar tudo é redondo, nada é quadrado. Marina é veredicto: depois de conhecê-la já não há mais em vão destino. Marina é possibilidade - de saudade ser saudade. Marina é fora dos modernos costumes - solicitude. Marina é amiúde, no olhar, infinitude.

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