terça-feira, 15 de dezembro de 2009

Intenso Bresson

Muito já se falou sobre a harmonia geométrica dos trabalhos de Henri Cartier Bresson, e talvez se deva ressaltar que o fotógrafo se apodera da realidade sem a mínima perturbação, já que seus desejos são firmes e vigorosos. Senão vejamos: não lhe interessa ver sem que haja uma força que lhe instigue, que lhe impele a fotografar o improvável com tanto senso estético, como é o caso de uma foto da cidade da Grécia onde escadas, muros e casas se harmonizam no vívido embate de planos irregulares, sem a menor falta de limpidez na refinada interação das linhas, na tessitura branca de suas paredes.


O prazer vem então do dinamismo rápido, mas não afoito, que se instaura aqui e ali; da fina e quase demorada percepção que existe antes do clic. Bresson, vale notar, não é adepto da fria geometria que ocorre num tabuleiro de xadrez sem peças; o que mais o mobiliza são as possibilidades que a dança das peças evocam...
Sem dúvida, outro fator importante, já de certa forma aludido, é a profunda compreensão da luz que Henri possui, pois cada cidade tem a sua luz, ora de forma mais áspera, ora com mãos de ninfa, ora mais suave e morna, e, em contraste, seus interiores transmitem uma paz de aprazível sombra.


Além disso, Bresson sabe como poucos ver um artista envolvido com os próprios trabalhos, basta lembrar a foto de Giacometti, na mesma inclinação de movimento, que uma de suas esquálidas esculturas, como se não só o criador, mas também as criaturas tivessem exigências da vida que clamassem por ação.



Enfim, pode-se dizer que Bresson, seja no equilíbrio, seja na luz, seja no tema, sempre produz uma delicadeza imponderável como quem tira a carta do envelope sem rasgar o papel...

quarta-feira, 9 de dezembro de 2009

O bem que uma coreografia faz...




Vai aqui uma dica: quem, por ventura, quiser entender a Civilização, sem dúvida, leia Kenneth Clark, ou quem quiser entender o Amor que leia Proust, agora quem quiser algo que não seja um livro, mas que fale com tanta paixão como aqueles; sugiro uma coreografia de Jiri Kylian. Nada pode ser mais doce em seus andamentos, nada pode ser mais vibrante que seus gestos. Jiri escolhe o corpo como material de trabalho, e sabe em que medida o movimento e sua gradual pausa são importantes caso sejam densos; e sabe, como poucos, dosar a intensidade que anima o corpo, intensidade que se soma na presença de outro corpo, pois uma chama instila a outra, o que torna a coreografia ainda mais expressiva. Quando vemos dois de seus dançarinos, plenos de vigor físico, e prontos a experimentar os limites que o corpo é capaz, não temos dúvida da beleza de tais duetos. Não temos dúvida que Jiri Kylian dispõe de tal forma seus dançarinos que dá a impressão de formarem algo tão volumoso como uma onda; cada gesto se levanta e cai com o mesmo vagar do mar. Cada olhar dos dançarinos está totalmente absorvido pela dança, como se fossem o lago de Monet e o que nele se reflete. Não há gesto que não seja profundamente sentido, nem mão que segure um corpo sem que contenha a eletricidade da noite. Jiri Kylian faz da dança um universo de extrema sensibilidade e de extremo fulgor; que se faz sentir na pele daqueles corpos...

quinta-feira, 3 de dezembro de 2009

Um chamado mais sedutor





As palavras nem sempre são mais fortes que as imagens, portanto uso as fotos de Zé Marcos Carvalho para chamá-los novamente para a exposição Reticências na Oficina Cultural Oswald de Andrade que vai áté o dia 16/12, em que participo com os pequenos textos sobre os 22 artistas que lá participam.

Sobre cada superfície, um sonho



No trabalho de Vera, todos podem participar e o processo é simples: uma sobreposição de fotos no acetato, que juntas, formam o que a artista, inspirada, chama de devaneios. E de fato é o que sentimos, pois quanto mais se olha o resultado final, mais somos atraídos pelo vigor plástico, mais percebemos que a escolha das fotos não é, de modo algum, aleatória. Os planos do que vemos ora se afastam, ora se aproximam ou também seduzem pela intensidade da cor ou seu esmaecimento (para dar idéia de distância), de modo que a artista foi sábia na escolha das fotos, que sempre surpreendem pelo jogo interno das camadas. A imagem que nasce é como a revelação química dos filmes, que ainda se fazem raramente, devido ao advento da máquina digital; a diferença é que uma seduz por nascer do nada, a outra por nascer da conjunção de muitas fotos. E assim, pode-se concluir que sua poética possui muitas possibilidades, ou dizendo melhor, que cada observador possui a possibilidade certa para cada um de seus sonhos...

Obs: Fotos de Zé Marcos Carvalho

A vivacidade de tons frios



É preciso uma longa busca interior para se chegar aonde Walter chegou, pois a aparente simplicidade plástica que possui, exige uma dedicação e concentração, extremas. Seus quadros, sumariamente falando, são de tons frios e o mais interessante é a maneira de trabalhar essas nuances, uma vez que Walter proporciona graus de intensidade muito próximos um dos outros, como se houvesse sutis cintilações na superfície da tela. Além disso, Walter entra com manchas que de forma alguma são acidentais; são, na verdade, controladas e moduladas para alcançar uma vibração das formas, para ir ao encontro da alma da cor, assim como da alma da escuridão. O tempo todo, nós sentimos o pulsar da tela e uma atração irresistível por sua completa afirmação da vida; Walter mostra para nós que não é preciso cores como o amarelo, o azul, o vermelho (cores alegres por natureza) para que haja também, outro modo, mais silencioso e introspectivo de ser alegre.

Obs: Fotos de Zé Marcos Carvalho