quarta-feira, 29 de maio de 2013

Na praça, os olhos desolados




Enquanto estou à caminho de casa, vejo o seu Sérgio, diante da praça, cabisbaixo, e com o olhar perdido, praça que ele sempre cuidou com tanto carinho, e hoje, esta mesma, em total desalinho, com folhas por toda a parte, no momento sem nenhuma ação de suas próprias mãos. Cumprimento-o, e percebo os seus olhos tristes, a voz ébria, jamais de alegria, por um único fato: "Hoje estava crente que ia receber por meu trabalho", logo me alerta. "Um mês e vinte dias de labuta - e nada", prolonga-se. Seu Sérgio antes recebia pela prefeitura, mas me disse que quinhentos cuidadores de praça estão desempregados, entre eles, também ele.

E continuava do mesmo modo a trabalhar por que acreditava que ia ganhar o seu salário através dos moradores das redondezas. "Sabe, Fabinho, o rapaz dos prédios coloridos até me confirmou que estava tudo certo. Venho, trabalho, mas onde o dinheiro?" Faz gestos com a mão, e fala: "Eu ia deixar tudo isso limpinho. Você sabe como eu deixo bonita a praça, não sabe?". E eu confirmo quando ele pergunta, uma vez que de fato ele sempre deixava impecável. "Hoje eu fiquei muito triste. Tomei até uns tragos", confessa. "Aqui eu me dou bem com todo mundo. Me respeitam e coisa e tal. Pagamento é só o que falta", resmunga. Seu Sérgio pretendia, de coração, arrumar a praça, e o que lhe angustiava era isto: era um órfão de amizade, embora todos se mostrassem amigos. "Tenho aluguel para pagar, despesas, e agora estou nesta situação", rumina, entre mim e ele, à medida que coça os cabelos brancos, e se desgrenha da mesma maneira que o vento desgrenha as folhas secas do chão já não mais propenso à limpeza.

Seu Sérgio, uma vez caiu de uma laje, quando foi ajudar alguém a pegar sacos de cimento, e sem dúvida, ficou bem machucado. Mesmo assim, sem nem se recuperar bem, voltou ao labor. Uma praça de trezentos metros quadrados que poderia ser o ganha pão da vida dele até o fim da vida, e, no entanto, ultimamente se tornou um pão amanhecido de casca dura e sem miolo, muito menos com direito a café. E por isso ele bebe, embora o pudor que havia de esconder a bebida na bolsa ainda persista. Bebe em algum lugar escondido, e de feição murcha se deixa levar pelos próprios pensamentos. Aquele homem ágil, apesar da velhice, não dá sinal de sombra. Ou melhor, o que encontramos agora é um homem todo sombra. Obscura, e fria, como esta praça. Num outono, sem flores tão próximas. Sem sorrisos que lhe animem, por mais sinceros que sejam. Uma terra fértil apenas para que se caia folhas secas. Mas será possível que caia destas árvores altas e frondosas alguma esperança para este homem ao léu? Em terra, e, entretanto, ao léu? Agora entendo o motivo de ele olhar mais para o chão do que para o céu.

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