segunda-feira, 12 de agosto de 2013

O que um olhar faz



Um olhar, e eu digo quanto ao olhar
que dirijo ao meu amor, além de olhar,
é forma de esculpir a sua alma.

Desde o primeiro momento eu sabia
que não era qualquer material,
pois há aqueles que não são feitos para durar,
e a alma de meu amor era mármore bruto,
pois quando o amor começa, em alma bela,
tudo é mármore bruto.

E não se realiza de imediato,
demora anos, mas no primevo desbaste
já se conhece o escultor.
E a qualidade de amor que engendra.

Tanto que a partir dali,
enquanto estiver comigo,
seja que outro homem
talvez surgir por seu caminho,
os seus olhos não serão olhos.
Estarão voltados para o primor subterrâneo,
e apenas palpável para ela e o próprio escultor, eu.
Pode até olhar, no entanto,
para ela não haverá desbaste.

E para onde ela for
a luz que entra em sua alma
será tão-somente para enxergar melhor
a porosidade singular
da própria densa substância.

O mundo ao redor será
alvorecer, entardecer e anoitecer,
cada qual para demonstrar
o significado da escultura
ser tridimensional.

Seu escultor não só desbasta,
também tateia a pedra,
e reconhece nas mãos o valor dela,
sabe que pode haver golpes imprecisos,
embora sempre haja critério,
nem por isso deixa de aprender
a cada dia com o seu exclusivo ofício.

Se dá voltas na mesma pedra
para encontrar sutis ângulos
é pelo fato de descobrir,
aqui e ali, o insólito
que precisa de mais apuro.

Há obra final?
Que eu saiba não.
Pois eis uma obra inconclusa.

Claro que todo o escultor
não é um típico escultor.
Cada um possui o seu estilo.

Há mais de uma escultura
numa mesma alma?
Talvez. Mas há aquelas
que sugerem mais ternura.
Apagar aquela feita
com profundo amor
jamais é possível.
Que porventura fique
em algum canto esquecido,
não quer dizer que repentina luz
não lhe venha à tona.

Muitos e muitos anos
com ou sem o seu amor
estará, sem dúvida, lá.
Em dias de tempestades e borrascas,
em dias de sóis e primaveras,
em dias de folhas secas e névoas,
em noites de melodias e luares,
com certeza estará sempre lá.

Por toda a vida lá.

Os olhos dela poderão morrer
um dia, e ainda assim
estará lá.

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