Quando algum filme toca
fundo, é sempre duro fazer deste cosmos que se esquiva palpável mundo. É sempre
duro fazer do que há de mudo latente inequívoca palavra. Falar de
"Amor", de Michael Haneke, é mais do que falar. É necessário murmurá-lo
para compreendê-lo. Ou até mesmo apenas "respirar" sobre a pele da
audiência para trazer com inteireza tão pungente relato. Pois é apenas, aqui e
ali, que o testemunho se torna verbo. O que predomina é a perturbadora
intermitência do silêncio e de seus sofridos hiatos, que de algum modo minam
aos poucos a serenidade do casal, mas jamais a ternura por demais humana, mas
jamais a saudade por demais verdadeira dos tempos idos. Ela e ele, por certo,
já são idosos, enquanto a morte arromba os trincos por dentro dela, a tal ponto
que nem mesmo o mais hábil dos ladrões é capaz. Rouba assim, pouco a pouco, e
não menos que de repente, as janelas de seu lar, a alma. Rouba, não há dúvida,
qualquer possibilidade de vento. Embora haja sempre o marido por perto e
presente, justamente o que lhe resta de frestas ainda não vedadas.
Qual não é portanto o
sofrimento deste homem? Que não poupa esforços para mantê-la viva, nem deixa de
protegê-la de tudo e todos. O que ele deseja é somente, uma vez mais, sentar ao
lado dela na mesa, para quem sabe reconhecer de novo o olhar de sua esposa, não
mais o olhar de juventude, não mais o olhar de sol a pino, mas sim o olhar crepuscular,
que não inflama, mas consola. Aquele olhar que lhe povoa de estrelas, aquele
olhar que não se importa qual venha a ser a estação da Lua, uma vez que o que
vier é doce lucro. Aquele olhar que caso venha com um sorriso tudo acalenta,
qual jasmim noturno, qual chuva alentadora, qual vento que pouco importa o porvir.
É só o que ele pede para o que ainda há de cinco sentidos. Afinal, a vida
sempre será vida, embora a morte jamais deixe de ser morte. Afinal, a vida
decerto possui o seu fim, assim como a morte possui o seu indiscernível começo.
Quer se queira ou não, tanto em morte quanto em vida, nada resta senão amar e
calar, por mais que a morte seja um calar enquanto se ama...
Obs: Foto do Google.
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