Há no mistério da vida algo
que punge, pelo fato de tudo ser névoa que se mescla a algum insólito perfume.
Com a arte de Salvador Dali não é diferente, pois surge premente de
significados. E quanto mais simples em seus elementos, mais plena de difuso
centro, embora jamais confuso, pelo menos não neste quadro em questão.
Prevalece nele uma clarividência excepcional, um vigor plástico cuja ousadia
advém de um belo ímpeto qual instinto de poeta, uma vez que cada parte do todo é sempre o todo em
sua total integridade, em sua total dignidade.
De que região vem este rosto
deposto ao chão? De que lugar avulta sem abrigo, sem teto, sem nenhum consolo a
contento? De que modo posso albergar teus olhos em meio à desolação, em meio à
insolação da alma? Ainda que seu rosto seja composto por integrantes de uma
provável tribo, onde, eu me pergunto, onde já vi rosto mais perdido? Eis que
tenho o pendor para de algum modo afagá-lo, assim como o vento afaga uma
planície, a tal ponto que talvez fosse possível do verdor de sua cabeleira
vegetal a singeleza de um pomar. Ou senão, talvez fosse possível da maçã de seu
rosto - a casa da tribo - motivo de brando fogo para o sono. E da parede que
forma o pescoço talvez fosse possível a peraltice de uma criança ao trazer
palavras e sorrisos para o torcicolo. E quem sabe assim ao menos se teria para
este rosto um pouco de consolo, verdade maior que toda arte no fundo busca para
desofuscar a alma combalida da humanidade.
Obs: Obra de Salvador Dali, encontrada no Google.
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