Segovia, sim, simplesmente Segovia a fim de que haja alma
para a alma. É somente o que mais anseio no momento - esse dedilhar que brilha
reluzente tal qual o dia. Paz que se sugere nota por nota, gota por gota de
mel. Alegria que se alonga tal como aurora. Tuas mãos são de anjo, e que
concebem milagres entre as possibilidades latentes de cada acorde. Faz nascer
em minha alma as milhas do albatroz. E com o poder de ser asas e pausa
clarividente tudo recomeça em mim. Fico como que ausente dos problemas, tudo é
poema. Deixo de ser apenas eu para ser agora, e com bom agouro, melodia. Não
disfarço mais em mim o enlace com o Mundo. E por vontade própria deslindo o que
há de lindo no oco em nada oco do violão, bem ali onde o cosmos possui foco, ou
seja, irrevogável harmonia. Quiça paro tudo, paro meu ser, recolho-me de sua
vertigem, para ser suspensão no Tempo - arvoredo que se concebe voz ao longo do
vento. Brando luar que não se abranda na dama-da-noite. Canto de qualquer
pássaro que confunde os turnos do dia e da noite, pois absurdo mesmo é não
cantar.
Com a tua música posso ser deleite, sem enfeites, puro vigor
de alma. A partir da qual me reconheço eu apesar do eu, me reconheço outro
apesar do eu sempre eu. Calo o cansaço de meu ser através de tua música. Poço
que descobre, sem sair do lugar, renovado acalanto de águas subterrâneas. E o
que permanece em mim é a gratidão por este homem que se confiava às cordas do
violão, devoto do enlevo, e que tinha por vocação encontrar lucidez bruxuleante
nas cordas de seu inviolável violão. Em tudo e por tudo prevalecia nele a
pureza do puro que tudo purifica.
Obs: Foto de Segovia, encontrada no Google.