terça-feira, 9 de fevereiro de 2010

A riqueza gráfica de Chagall



Visitar a exposição de Chagall, no Masp, em plena terça-feira, mesmo sem ser feriado é como se fosse. Não que esteja trabalhando (recupero-me de uma operação no joelho), mas ainda assim me dá essa sensação maravilhosa e duradoura, que prolongo escrevendo. A mostra, dividida em quatro salas, logo no início nos presenteia com a exuberância das litogravuras, em paisagens absorvidas por sonho onde o amor é tema fundador. Quando digo absorvidas é porque a cor se difunde como o frescor de uma brisa onde não só as vilas como também os personagens rompem com o tênue limite entre realidade e sonho.
Basta lembrar o pôr-do-sol de intenso vermelho em que dois namorados harmonizam e fundem seus corpos à cintilação do horizonte para esquecer por um momento as atribulações da vida. Basta um chão sem a solidez natural de chão, feito para que os anjos pisem e reconheçam seu lugar na Terra e, assim, tudo o que é humano e falível recebe o sopro suave e consolador do perdão. Mais do que uma mera exposição, que se vê vez por outra, mas felizmente não sempre, ver Chagall é como ouvir boa música sem pressa para o regozijo, sem pressa para o exame detalhado que merece. Pois suas litogravuras além de nos tocar as cordas da alma como uma harpa, foram muito bem planejadas e, com uma naturalidade e desprendimento como resultado, que as fazem tão alegres quanto as cenas de festas de Renoir.
De certo, esse era apenas o primeiro espaço; o segundo e o quarto, ainda não pude ver em sua total integridade, por isso espero a possibilidade de voltar ao assunto depois. Já a terceira sala tinha como tema as cenas bíblicas e, à primeira vista, como estava cansado por causa do joelho, sentei, e achei, de longe, cenas de pouco drama e com toques de cor um tanto deslocados, isso, repito, à primeira vista e daquela forma. Depois, quando pude ficar de pé e me aproximar mais, tive a visão inexorável do gênio que é Chagall. Direto, denso e sem detalhes fúteis como um Rembrandt e assim Chagall foi capaz de conferir vida ao que já havia de profunda vida nas histórias bíblicas. Com um acréscimo que não havia nas gravuras do holandês: a cor. Com ela, Chagall podia sugerir com lirismo a chama espiritual de seus personagens e de tal modo delicada que, novamente, percebi o meu total engano inicial. Para quem não viu, veja; para quem já viu, por que não rever?

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