domingo, 12 de setembro de 2010
Lampejos
Arte de Roger Van der Weyden
A última vez que ouvi Chet Baker era noite; não me pergunte se havia estrelas, não me pergunte da Lua, pois eu era só ouvidos...
Kind of Blue percorre a pele como veludo.
Chardin pinta como Rubem Braga escreve...
Rachmanicov faz do dia um eterno fim de tarde.
Há canções que transmitem uma serenidade que só os rios de grande largura conseguem ter.
O piano é um instrumento pequeno demais para dedos incultos e infinito para as mãos de Horowitz...
Leonard Bernstein é um demônio que se veste de fraque...
Leonard Bernstein mostra que até durante a tempestade há períodos de bonança.
A vibração das águas no impressionismo assemelha-se às frágeis pálpebras de um senhor de idade.
A música de qualidade logo no início já nos arrebata, assim como sentimos que a chuva está por vir através de seu cheiro na mata.
A música ruim é que nem elevador sem vista panorâmica, nós subimos sem saber para onde.
Às vezes, Glenn Gould faz sua música como quem pinta uma paisagem distante tocada por uma tênue luz...
Nenhum perfume me pega tão desavisado e deslumbrado como a voz de Tiê.
A música está para os ouvidos o que o pêssego está para o tato.
A música é a minha cama de eremita com um colchão por cima.
Foi um prazer perceber o volume sonoro da 5ª sinfonia de Beethoven na mesma intensidade que a vigorosa corrente de vento, que se regalava nas parreiras de um coqueiro.
Ouvir música é como velejar, uma vez que sabemos aonde queremos chegar, só não sabemos que vento vai nos levar até lá.
Sempre de algum modo tememos a morte; eu temo às vezes os olhos que não são como dessa jovem de Roger Van der Weyden.
A música é tão delicada como uma borboleta, portanto, em vez de dedos rudes, ofereça o reverso das mãos.
Bach é tão suave que se mistura ao farfalhar de folhas secas antes que nossos pés interfiram no estralo mais sonoro daquelas.
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