sexta-feira, 7 de maio de 2010
A intensa dignidade de Rostropovich
A música, em toda a sua ampla variedade, solicita de nós a arte de ter sempre ouvidos embevecidos e olhos que compreendem a melhor hora de permanecerem fechados. Chego a tal conclusão, ouvindo o Cello Concerto de Dvorak, no You Tube, numa atuação vibrante da Orquestra e de seu grande solista, Rostropovich. Já no primeiro movimento, fico deslumbrado com a orquestra que explora o tema central da mesma forma que os Deuses gregos resolvem os seus amores, impetuosos em seus arroubos e com extrema ternura quando prevalece a paz.
Rostropovich, dono de um rosto imperturbável, mostra as virtudes de um solista, pois embora não seja o maestro e nem olhe para a orquestra, tem plena consciência de como sua presença é necessária; compreende quando a soma de sons ergue uma onda cuja espuma súbita nada mais é do que a vivacidade de seu cello, exercendo todos os momentos decisivos, próprios de seu labor paciente. Com efeito, Rostropovich toca seu instrumento com a concentração de um alfaiate, com a precisão de sempre possuir uma agulha nas mãos, com a memória vigorosa de quem conhece o verso e o reverso de uma calça, a ponto de nunca se esquecer de onde partiu nem de onde quer chegar.
E é justamente, no adágio, do segundo movimento, que minhas pálpebras acolhem meus olhos e os tiram de qualquer agitação, tal é a densidade delicada que escuto; tudo isso devido àquele modo de sustentar uma melodia sem recorrer a excessos, sem nunca perder a sinceridade que aflora em toda a grande música. É assim, portanto, que se conhece o sublime apelo de um intérprete, por sua força de canalizar toda a sua energia para um mesmo fim. Algo que vai perdurar no último movimento, sem sombra de dúvida. Dito isso, posso acrescentar que vale a pena conferir tal vídeo, nem que seja para ter os olhos fechados, enquanto os ouvidos cumprem todas as funções do coração.
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